Mamíferos podem respirar pelo ânus em situações de emergência, comprova novo estudo

Fotografia: Forest Simon/Unsplash

Uma equipa de cientistas japoneses demonstrou que os mamíferos podem absorver oxigénio através do ânus. Intrigados com a forma como certas criaturas marinhas respiram pelo intestino em situações de emergência, investigadores da Tokyo Medical and Dental University puderam demonstrar o mesmo em circunstâncias experimentais para murganhos, ratos e porcos. As suas descobertas foram publicadas na revista Med nesta sexta-feira (14).

Os cientistas argumentam que os humanos também poderiam recorrer a esta possibilidade em caso de dificuldades respiratórias quando os ventiladores não estão disponíveis ou são inadequados.

Para animais de ordem superior, a respiração envolve inalar oxigénio e exalar dióxido de carbono pelos pulmões ou pelas guelras.

No entanto, algumas espécies desenvolveram mecanismos alternativos de ventilação.

Alguns tipos de peixes, bagres, pepinos-do-mar e aranhas obreiras também podem usar o seu intestino posterior (o recto) para oxigenação e sobrevivência em situações de emergência. Isso é chamado de ventilação enteral através do ânus ou EVA (sigla em inglês): “O recto tem uma rede de finos vasos sanguíneos logo abaixo da superfície de seu revestimento, o que significa que as drogas administradas pelo ânus são facilmente absorvidas pela corrente sanguínea”, disse o autor principal do estudo, Ryo Okabe.

A equipa perguntou-se se o oxigénio poderia atingir a corrente sanguínea da mesma maneira. Para responder à pergunta, decidiram conduzir experimentos com murganhos, porcos e ratos privados de oxigénio usando dois métodos: administrar oxigénio através do recto como um gás e infundir um enema carregado de oxigénio pela mesma via.

“Pacientes com dificuldade respiratória podem receber suporte no fornecimento de oxigénio com este método para reduzir os efeitos negativos da privação de oxigénio enquanto tratam da doença subjacente”

Os pesquisadores prepararam o revestimento do recto, esfregando-o para gerar inflamação e aumentar o fluxo sanguíneo, o que melhorou a eficácia do abastecimento de oxigênio.

No entanto, como tal preparação provavelmente seria inaceitável para humanos, eles também tentaram usar perfluorodecalina oxigenada, um líquido que já se mostrou seguro e está em uso clínico selectivo.

O fornecimento de oxigênio nas formas gasosa e líquida aumentou a oxigenação, normalizou o comportamento dos animais e prolongou a sua sobrevivência.

“Desperta interesse”

A equipa também confirmou melhorias na oxigenação a nível celular, por meio de uma técnica chamada coloração imunoquímica. Os investigadores acrescentam que a pequena quantidade de líquido que foi absorvida junto com o oxigénio não causou danos e não perturbou as bactérias intestinais, indicando que o método era seguro: “Pacientes com dificuldade respiratória podem receber suporte no fornecimento de oxigénio com este método para reduzir os efeitos negativos da privação de oxigénio enquanto tratam da doença subjacente”, acrescentou o co-autor Takanori Takebe.

A equipa espera estabelecer a eficácia da técnica em humanos num ambiente clínico.

Num comentário complementar, Caleb Kelly, da Yale School of Medicine, considerou que o EVA deveria ser levado a sério: “Esta é uma ideia provocativa e aqueles que a estão a encontrar pela primeira vez vão expressar surpresa”, disse ele. “No entanto, à medida que o potencial clínico é considerado e os dados apresentados por Okabe e outros autores são examinados, o EVA surge como uma terapia promissora que merece interesse científico e médico.”

A técnica pode ser útil quando há falta de ventiladores, como visto na actual pandemia de coronavírus, acrescentou o especialista.

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