Dura lex, sed lex? Lei da Segurança Nacional revela faceta opaca de Pequim

A adopção por parte da Assembleia Nacional Popular da Lei da Segurança Nacional, debatida e votada num período relativamente breve e com um articulado debatido à porta fechada, ilustra a forma como funcionam as instituições governamentais na República Popular da China. O secretismo, a opção por não prestar contas a quem é governado e por contornar os compromissos assumidos faz escola, num país que insiste em trilhar o seu próprio percurso e afastar-se das práticas internacionais.                       

Menos de seis semanas de debate

Em 21 de Maio, Pequim anunciou que a Assembleia Popular Nacional ia estudar um texto sobre a “segurança nacional em Hong Kong”. Menos de seis semanas depois, em 30 de Junho, o projecto de lei foi aprovado por unanimidade pelo Comité Permanente do hemiciclo chinês. Ou seja, por um total de 163 deputados, dos quais apenas um é residente de Hong Kong.

A lei entrou em vigor durante a noite de terça-feira, horas depois de ter sido promulgada, anunciou a chefe do Executivo do território vizinho, Carrie Lam, bem a tempo de silenciar a oposição numa data com grande simbolismo para o regime comunista: o 23º aniversário do regresso de Hong Kong à soberania chinesa, a 1 de Julho de 1997. O texto é visto como uma resposta aos protestos de 2019 contra o aumento da influência de Pequim na antiga colónia britânica.

Um texto secreto

Mesmo depois de ter sido promulgado pelo presidente chinês, Xi Jinping, o projecto de lei adoptado pelos delegados à Assembleia Nacional Popular ainda não foi divulgado na íntegra publicamente.

A agência oficial de notícias Xinhua antecipou que a lei vai reprimir o separatismo, a subversão, o terrorismo e o conluio com forças estrangeiras, que serão punidos com pena de prisão perpétua.

A própria Carrie Lam reconheceu que não viu o texto a ser aplicado. As punições previstas para os autores de “crimes” contra a segurança nacional ainda não são inteiramente conhecidas: “O facto de o povo de Hong Kong não saber o que a nova lei realmente contém é totalmente absurdo”, disse Claudia Mo, deputada da oposição.

Conselho Legislativo contornado

O texto vai ser indexado directamente à Lei Básica de Hong Kong, mas o Conselho Legislativo não se manifestou sobre o processo, ao contrário do que está definido na lei fundamental.

Pequim tirou proveito de uma disposição constitucional que autoriza o Governo Central a incluir, com certas condições, emendas à Lei Básica, a “mini-constituição” que garante alegadamente a autonomia da vizinha Região Administrativa Especial.

Nos termos do artigo 23 da Lei Básica, Hong Kong tinha necessariamente de adoptar uma lei de segurança nacional. A última tentativa do Executivo local, em 2003, fracassou, devido à mobilização massiva da população: “Todos os países que apontam o dedo à China adoptaram a sua própria legislação de segurança nacional”, disse Lam numa mensagem em vídeo divulgada no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, na terça-feira. A maior parte dos países que o fizeram não são ditaduras onde o primado da lei é suprimido, alega a oposição no território vizinho.

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