O que aprendemos até agora sobre o Covid-19?

O Covid-19 foi comunicado pela primeira vez à Organização Mundial de Saúde a 31 de Dezembro de 2019.  A sequência genética deste novo coronavírus é em 80 por cento semelhante à do coronavírus responsável pela Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS). A transmissão de humano para humano ocorre por gotículas de saliva. O período de incubação varia de 2 a 14 dia, com o pico a ser registado por volta do quinto dia. Adultos com mais de 55 anos, com doenças crónicas ou com um sistema imunológico deficitário são mais susceptíveis de contrair Covid-19.

Jorge Sales Marques

Pediatra.  Director do Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar Conde de São Januário, em Macau

Porque razão o novo coronavírus afectou até ao momento um número tão pouco significativo de crianças com menos de 10 anos de idade (menos de 0,1 por cento dos casos de infecção registados)? A estimulação frequente do sistema imunológico através de vacinas nos primeiros 18 meses de idade, seguida pelo reforço da vacinação entre os 5 e os 6 anos e entre os 10 e os 13 – e a sujeição frequente a infecções virais durante a infância, nos infantários e nas escolas – pode ser responsável por esta constatação surpreendente. Por outro lado, médicos e investigadores sabem que há quatro coronavírus que afectam humanos e que são responsáveis por sintomas respiratórios de gravidade baixa a moderada, como é o caso dos resfriados e constipações. Estes coronavírus podem ser responsáveis por 10 a 25 por cento de todas as infecções do trato respiratório superior. Estas circunstâncias podem estimular a memória imunológica e ajudar crianças e jovens a responder melhor à infecção pelo novo coronavírus. Nos adultos, apesar de tanto as infecções virais, como a sujeição a vacinas serem frequentes, a memória imunológica não é a mesma.

Os sintomas do Covid-19 são semelhantes aos da gripe, com tosse e catarro em 80 por cento dos casos, diarreia em 4 por cento, dificuldades respiratórias e, numa fase mais severa, pneumonia. Alguns pacientes podem apresentar insuficiência respiratória grave e a doença pode ser fatal. A mortalidade é de cerca de 2,5 por cento, menor que a decorrente da SARS, doença que vitimou 9,4 por cento dos pacientes infectados. O risco de contágio é, porém, maior! Até ao momento, mais de 100.000 casos – a SARS afectou cerca de oito mil pessoas – foram diagnosticados em cem países e territórios.

Perante este cenário, o que se recomenda? Existem quatro procedimentos que qualquer pessoa, onde quer que esteja, pode adoptar:

1- usar a máscara correctamente;

2 – lavar as mãos por pelo menos 20 segundos e repetir várias vezes ao dia;

3 – evitar locais superlotados;

4- manter-se em casa o mais que puder;

O que aconteceu em Macau? O que fizeram o Governo e a população? A população de Macau cumpriu rigorosamente as recomendações da Direcção dos Serviços de Saúde e do Governo. As pessoas usavam e usam máscara em todos os locais por onde se movimentam, incluindo nos locais de trabalho, nos transportes públicos e nas ruas. Lavam as mãos com água, sabão ou gel de álcool desinfectante. Permanecem em casa se não têm necessidade de sair e evitam deslocar-se ou permanecer em lugares com uma concentração elevada de pessoas. A população seguiu à risca as recomendações do Governo e dos Serviços de Saúde, com um espírito de comunhão e de total cumplicidade. Durante o período de crise suscitado pelo surto epidémico do novo coronavírus, as ruas ficaram quase vazias, lojas, clínicas particulares, ginásios, alguns hotéis encerraram. E até os casinos fecharam portas. As escolas – do ensino primário às universidades – permanecem de portas fechadas e os alunos prosseguem os estudos através de estratégias de ensino à distância até que a situação esteja considerada sob controlo.

As autoridades verificaram a temperatura de qualquer pessoa que saísse e entrasse em Macau, numa prática que foi adoptada por serviços públicos e privados em todo o território. No Centro Hospitalar Conde de São Januário, o hospital público de Macau, as consultas foram adiadas ou conduzidas por telefone ou videoconferência. As visitas a pacientes hospitalizados foram canceladas. O Governo restringiu a movimentação de pessoas vindas de fora e impediu a entrada de visitantes oriundos de áreas de risco. Macau fez e continua a submeter a testes de despistagem pessoas com risco de contágio. Os que foram infectados ou que contactaram com pessoas com Covid-19 foram colocados em quarentena. Os cidadãos de Macau foram protegidos, mas as autoridades também ajudaram a diagnosticar pessoas – turistas ou outros – que fizeram questão de entrar em Macau para visitar o território, para fazer compras, para jogar ou apenas para provar as excelentes iguarias que por cá se podem encontrar.

Com esta total cooperação entre cidadãos, Governo e Serviços de Saúde constitui o melhor dos exemplo para todo o mundo. O território não regista novos casos de infecção pelo novo coronavírus há um mês e os dez pacientes infectados pelo novo coronavírus já receberam alta hospitalar. Com todo o respeito que merecem os países e territórios afectados e os planos de contingência contra o Covid-19 promovidos pelas autoridades de saúde, o teor das medidas adoptadas deve ser semelhante às promovidas por Macau. A única forma de conter a propagação do coronavírus nos seus próprios países e a disseminação por outras nações e territórios é convencendo as pessoas que estão perante uma ameaça grave.

É essencial que entre as recomendações que os Governos transmitem à população estejam os quatro procedimentos acima elencados e que os profissionais de saúde sejam apoiados não apenas com máscaras, luvas e equipamentos de protecção, mas também com fluxogramas e informações actualizados de forma constante.

Por fim – mas não menos essencial para que o combate à disseminação do novo coronavírus seja bem sucedido – os Governos precisam de ter coragem para assumir e decretar medidas difíceis. A luta contra o Covid-19 não é apenas uma luta de Macau. As cidades, os territórios, os países afectados e a Organização Mundial de Saúde têm de unir forças para vencer a guerra contra o novo coronavírus. Têm de estar dispostas a aprender com outros países e territórios e, se for possível, reproduzir aquilo que fizeram de bem para impedir a propagação  da doença. Se os resultados forem bons, é preciso mostrar abertura para aprender – e porque não pedir a quem tem mais experiência ou melhores resultados – uma opinião, uma sugestão ou mesmo ajuda. O inimigo, para além de invisível, é um inimigo comum e esta é uma luta global. Junte-se às forças.

(Testemunho originalmente publicado em língua inglesa por Jorge Sales Marques na sua página pessoal da rede social Facebook. Foi traduzido e publicado com a autorização do autor.)

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