Caso Costa Nunes. Notificações do MP chegaram só em chinês

O Ministério Público comunicou na sexta-feira o arquivamento do processo de investigação dos abusos que teriam sido alegadamente cometidos por um funcionário do Jardim de Infância D. José da Costa Nunes, mas os pais que não se expressam em chinês tomaram conhecimento da decisão por terceiros. Uma mãe ouvida pelo Expediente Sínico acusa o Ministério Público de ter omitido parte das declarações prestadas pelas crianças durante o processo interrogatório a que foram submetidas.

O Ministério Público arquivou a investigação relativa aos alegados abusos sexuais perpetrados por um antigo funcionário do Jardim de Infância D. José da Costa Nunes por considerar que não existem provas suficientes para que o processo seja julgado.

A informação foi esta segunda-feira avançada pelo jornal Ponto Final e foi confirmada ao Expediente Sínico por uma das famílias que denunciaram o caso, em Maio último, junto da Polícia Judiciária. O agregado familiar em questão –  que não se expressa em língua chinesa – não foi, no entanto, notificado pelo Ministério Público e soube do arquivamento do processo por outros casais que também fizeram chegar queixas à polícia de investigação do território: “Ainda não recebi a notificação, mas já sabia desde sexta-feira, quando outros pais foram notificados. Creio que só notificaram as famílias que sabem ler chinês e agora devem estar a fazer a tradução para os restantes”, adiantou a mãe de uma das crianças envolvidas no processo. “Fomos surpreendidos por este resultado. Macau não está preparado para lidar com casos como este. O relatório do Ministério Público omite parte das declarações prestadas pelas crianças no interrogatório”, sustenta ainda.

O casal ouvido pelo Expediente Sínico contesta não só a decisão, tomada pela Procuradoria, de arquivar o processo, mas também o modo como lhes foi comunicado o arquivamento: “Acho que devíamos ter sido notificados pelo Ministério Público em simultâneo, ao invés de ter que saber da notícia por terceiros”, defende a progenitora. “Por outro lado, a nossa filha nunca chegou a ser ouvida porque quando foi chamada para ser interrogada não tinham nenhum especialista nestes casos para fazer as perguntas. O que nos disseram é que iam arranjar alguém, mas o processo foi encerrado sem ela ser ouvida”, revela.

Os queixosos têm até 25 de Fevereiro para reclamar da decisão tomada pelo Ministério Público, um aspecto que está a ser ponderado pelas famílias das crianças que terão sido vítimas dos alegados abusos: “O que foi dito em interrogatório pelas crianças foi completamente ignorado e a informação omitida. A maioria dos pais já partilhou a sua preocupação com o resultado do Ministério Público sobre o caso. Temos uns dias para recorrer e estamos a pensar de que forma o podemos fazer”, admite a mãe escutada pelo Expediente, por entre críticas à Associação Promotora da Instrução dos Macaenses. A progenitora diz que ainda está à espera de explicações da direcção do Jardim de Infância D. José da Costa Nunes: “A investigação interna da escola também foi concluída e até agora nada foi feito, nem explicado convenientemente porque nada foi feito”, salienta.

APIM serena

A APIM vai reunir-se esta semana para analisar a decisão tomada pelo Ministério Público, disse ao Expediente Sínico o presidente do organismo, Miguel de Senna Fernandes.

A Direcção da Associação Promotora da Instrução dos Macaenses também não foi notificada do arquivamento do processo, mas também não tinha de ser, explicou o presidente do organismo ao Expediente Sínico: “Não fui notificado, nem tinha de o ser, uma vez que a APIM não era parte do processo”,  adianta Miguel de Senna Fernandes. “Os ofendidos são os pais e estes, provavelmente foram noticiados”, complementa.

O presidente da Asssociação Promotora da Instrucção dos Macaenses adianta que a direcção do organismo vai reunir-se esta semana para analisar a decisão do Ministério Público. Senna Fernandes lamenta o impacto que o processo poderá ter tido sobre as crianças: “A posição da APIM é de serenidade. Vamo-nos reunir esta semana. Todavia, fico com penas das crianças. Eles sabem como isso foi. Podem não avaliar a total dimensão da gravidade, mas elas sabem. Todavia, não pode relevar para efeitos de incriminação. A bondado do princípio “in dubio pro reo” traz coisas destas também. Mas sinto a pele dos pais. Sou pai de três filhas que tiveram aquelas tenras idades”, assume o dirigente.

Em Maio último, a Polícia Judiciária recebeu sete queixa-crime contra um funcionário do Jardim de Infância, de origem filipina. O homem, entretanto despedido, era suspeito de ter abusado sexualmente de sete meninas. O Ministério Público aplicou a medida de coacção de Termo de Identidade e Residência. Os pais das alegadas vítimas acusaram ainda uma educadora de infância, a psicóloga e a própria educadora do Jardim de Infância de terem negligenciado queixas que teriam sido feitas em Fevereiro, três meses antes das suspeitas terem sido comunicadas à Polícia Judiciária.

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