O grupo petrolífero francês Total anunciou este domingo que vai permanecer no Myanmar, mas comprometeu-se a financiar os grupos de direitos humanos no país, onde a repressão contra os manifestantes pró-democracia após o golpe de Estado militar deixou centenas de mortos.
As forças de segurança mataram mais de 550 civis, entre eles mulheres e crianças, desde o golpe de Estado de 1 de Fevereiro, que depôs o governo civil de Aung San Suu Kyi, segundo a Associação de Ajuda aos Presos Políticos (AAPP).
Pode haver muito mais vítimas, visto que 2.700 pessoas foram detidas. Muitas, sem acesso a familiares ou a um advogado, estão desaparecidas.
O exército e a polícia dispararam munições letais tanto de dia quanto de noite, afirma a AAPP. No sábado, outros quatro civis morreram.
Perante o deteriorar constante da situação, as ONGs internacionais e locais e alguns políticos na França pediram à petrolífera Total, presente no Myanmar desde 1992, que abandone o país.
A empresa vai manter a sua produção de gás, que “fornece electricidade a uma população numerosa em Rangum”, a capital económica do país, informou este domingo o director-geral da petrolífera, Patrick Pouyanné.
O grupo tampouco quer expor os seus funcionários ao risco de “trabalhos forçados” se for embora.
O grupo pagou 230 milhões de dólares às autoridades birmanesas em 2019 e 176 milhões em 2020 a título de impostos e “direitos de produção”, de acordo com relatórios financeiros.
Bloquear os pagamentos “exporia os altos funcionários da nossa filial ao risco de serem detidos e presos”, afirma Pouyanné num artigo publicado no semanário francês Le Journal du dimanche.
A Total compromete-se a entregar às ONGs de direitos humanos a mesma quantidade paga ao Estado birmanês.
Protestos da Páscoa
Apesar da repressão sangrenta da Junta, a mobilização pró-democracia continua, com dezenas de milhares de trabalhadores em greve e sectores inteiros da economia paralisados.
Neste domingo de Páscoa, o movimento de desobediência civil difundiu pelas redes sociais imagens de ovos decorados com pequenas mensagens: “Salvem o Myanmar”, “Queremos democracia”, “Vamos expulsar MAH”, em alusão às iniciais do nome do poderoso chefe da junta Min Aung Hlain.
O acesso à internet continua interrompido para a maioria da população desde que o exército ordenou a suspensão dos dados móveis e das ligações sem fios.
Os generais também apertaram o cerco a Aung San Suu Kyi, acusada de corrupção e de ter violado uma lei sobre segredos de Estado que data da época colonial.
Se for considerada culpada, a antiga dirigente de 75 anos, que se encontra detida num local secreto, mas que está “bem de saúde”, de acordo com os seus advogados, corre o risco de ser afastada da vida política e de ser condenada a longos anos de prisão.
Foram emitidas ordens de prisão contra 40 celebridades: cantores, modelos, influenciadores, que são acusadas de ter difundido informação que pode provocar motins nas forças armadas.
Três membros de uma família que falaram com uma correspondente da emissora CNN foram detidos: “Exortamos as autoridades a dar informação sobre o tema e libertar de forma segura qualquer detido”, declarou um porta-voz do grupo norte-americano.
O derramamento de sangue contra civis provocou a revolta de muitas facções étnicas no país.
Dez deram o seu apoio no sábado à mobilização democrática e vão reexaminar o cessar-fogo assinado com os militares a partir de 2015, de acordo com o líder de uma delas.
Outra, a poderosa União Nacional Karen, condenou os ataques aéreos do exército no sudeste do país que, segundo ela, causaram mais de 12.000 deslocados e pediu às minorias étnicas do país (mais de 130) que se unam contra a junta.
Outros grupos rebeldes já ameaçaram retomar as armas.
A enviada da ONU para o Myanmar, Christine Schraner Burgener, advertiu para um risco “sem precedentes” de “guerra civil”.
Leave a Reply