Proeza tecnológica, fiasco comercial. O Concorde voou pela primeira vez há meio século

O Concorde fez-se aos céus pela primeira vez no início de Março de 1969, faz no próximo sábado cinquenta anos. O avião supersónico, que ligava Paris a Nova Iorque em pouco mais de três horas, é ainda hoje tido como uma proeza tecnológica, mas é também um dos maiores fiascos da aviação comercial. Recorde o atribulado percurso de um aparelho que continua a fascinar o mundo.

O avião supersónico franco-britânico Concorde – um símbolo da revitalização tecnológica da Europa do pós-guerra que ainda hoje desperta fascínio e admiração – realizou o seu primeiro voo há cinquenta anos, sob o olhar atento de jornalistas e curiosos que rumaram ao sudoeste de França para ver descolar o aparelho.

A 2 de Março de 1969, um domingo, o Concorde fez-se aos céus pela primeira vez em Toulouse, com o piloto de testes André Turcat aos comandos do “protótipo 001” do possante avião.

Às 15h30, a elegante silhueta branca do aparelho avançou pela pista, ganhou velocidade, descolou e em menos de nada desapareceu para além da linha do horizonte. Notoriamente emocionado, o locutor da BBC, Raymond Baxter, anuncia: “O Concorde voa finalmente!”. A AFP faz a notícia chegar aos quatro cantos do mundo num breve despacho: “Descola o Concorde”.

O protótipo 001, o primeiro Concorde a fazer-se aos céus a 2 de Março de 1969.

O momento era aguardado com impaciência desde 11 de Dezembro de 1967, data em que o aparelho futurista, concebido com asas em forma de delta, tinha sido apresentado.

Numa altura em que as missões aero-espaciais norte-americanas iam galgando etapa atrás de etapa no difícil caminho rumo à Lua, a construção de um avião comercial capaz de voar ao dobro da velocidade do som configurou-se como um motivo de orgulho quer para franceses, quer para britânicos.

Concord ou Concorde?

Nascido em Novembro de 1962 graças a um acordo bilateral assinado entre os governo do Reino Unido e de França, o projecto enfrentou várias dificuldades e obstáculos logo desde o início.

As duas empresas que se associaram com o propósito de construir o avião  – a British Aircraft Corporation e a Sud-Aviation, antecessora da Airbus – não se colocavam de acordo sobre as características do aparelho. A primeira defendia o desenvolvimento de um avião de longo alcance com capacidade para cruzar o oceano Atlântico, ao passo que a segunda era apologista da construção de um avião de médio alcance, semelhante ao famoso Caravelle.

Os desentendimentos não se ficaram por aí e até o próprio nome do projecto foi motivo de discórdia, entre a expressão inglesa “Concord” e a variante francesa “Concorde”.

Em 1967, o britânico Tony Benn, secretário de Estado da Tecnologia, resolveu a questão ao estipular que seria adicionado um “e” – “de excelência, England (Inglaterra), Europa e entendimento cordial” – ao final da palavra.

O primeiro voo de testes, realizado há meio século, não procurava estabelecer novos recordes, mas pura e simplesmente “mostrar que o avião voava” e “regressar a terra”, explicou mais tarde André Turcat, que seguia ao comando do aparelho na companhia do co-piloto Jacques Guignard, o mecânico Michel Rétif e o engenheiro aeronáutico Henri Perrier.

O “rugido” dos quatro potentes reactores e a silhueta da aeronave não passaram despercebidos a muitos dos que moravam no vale do rio Garona, escreveu então a AFP: “Os carros pararam na estrada nacional 113, na direcção de Bordéus […].Milhares de pessoas, nas montanhas e nos campos, assistiram, com a mão por cima dos olhos, à primeira manobra aérea” do Concorde.

No momento em que o avião tomou contacto com a pista, no regresso ao Aeroporto, os pneus geraram um “fumo espesso” e da parte traseiro do aparelho soltou-se um paraquedas, que ajudou o Concorde a abrandar na aproximação ao fim da pista. Uma chuva de aplausos irrompeu pouco depois. O voo durou 27 minutos.

“É uma máquina extraordinária”. As primeiras palavras de André Turcat após a aterragem abriam as portas do futuro ao estranho avião. “Este primeiro voo não é de todo uma conquista. Marca apenas o início do nosso trabalho”, esclareceu o comandante perante a imprensa, alternando respostas em francês e em inglês.

O Concorde ligava Paris a Nova Iorque em três horas e meia, bem menos que as oito horas pelas quais se prolongam os voos actuais.

Foram necessários, no entanto, sete anos e mais de 5500 horas de voos de teste para que a Air France e a British Airways fossem autorizadas a efectuar voos comerciais com recurso ao Concorde. A 21 de Janeiro de 1976 o avião supersónico é utilizado para ligar Paris e o Rio de Janeiro, num voo operado pela Air France, e Londres e o Bahrein, num voo operado pela British Airways.

Com uma velocidade máxima de cruzeiro de 2500 quilómetros por hora, o Concorde liga Paris e Nova Iorque em apenas três horas e meia, uma distância muito inferior às oito horas que são hoje necessárias para ligar ambas as cidades. Os últimos voos que efectuaram o percurso, em Maio de 2003, tinham um custo de 8100 euros.

A tragédia e o fiasco

A utilização do Concorde em voos comerciais foi descontinuado menos de três anos depois de um dos aparelhos da Air France ter protagonizado um dos piores acidentes de sempre da história da aviação francesa. A 25 de Julho de 2000, um Concorde despenhou-se pouco depois de ter descolado do Aeroporto Roissy-Charles de Gaulle. O acidente, que vitimou 113 pessoas e que foi causado por uma fuga de combustível após o rebentamento de um pneu, acelerou a retirada o Concorde. Entre 1976 e 2003, apenas se elevaram aos céus catorze aparelhos, um número muito inferior aos cem que o consórcio aspirava vender quando o aparelho foi lançado.

O último voo de um Concorde ao serviço da Air France realizou-se a 31 de Maio de 2003. Em Outubro do mesmo ano, os aviões supersónicos da British Airways também deixaram de voar.

O último voo comercial operado pela Air France descolou de Nova Iorque com destino a Paris a 31 de Maio de 2003. O Concorde acabaria por desaparecer por inteiro do espaço celeste menos de cinco meses depois. A British Airways efectuou as últimas ligações supersónicas entre Londres e Novas Iorque e com o fim dos voos terminou também uma era.

Be the first to comment

Leave a Reply

Your email address will not be published.


*


This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.